sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Eu sei exatamente a hora em que ele passa aqui na rua, então, fico esperando, tento nunca perder a hora. Quando vejo ele vindo lá de longe, desço correndo as escadas e espero ele passar na minha frente, ele sempre sorri e diz 'oi'.
Anda com uma calma que chega a me dar inveja, troca de passo como se tivesse medo de pisar no chão e machuca-lo. Acho que admiro ele justamente pela calma, o oposto sempre me atrai mais, isso sem contar que é um completo desconhecido.
Cheguei a contar para as meninas do colégio, que andava encantada com um moço desconhecido da rua e elas logo me perguntaram se era bonito, eu respondi que sim, claro que ele é bonito! Concluí descrevendo ele, contei que ele aparenta ter 40 anos, usa roupas de meninão e tem um sorriso encantador, e elas? Falaram um terrível "CREDO!". Pensaram que eu estava encantada por um Gianecchini da vida! Vê se pode!
Passei longos 3 meses descendo as escadas todos os dias, só para dar oi pra ele. Quando ele se atrasava eu ficava extremamente preocupada, suava frio, estralava os dedos... Ele sempre aparecia, devia se atrasar por pegar algum semáforo de pedestre fechado.
Certo dia, resolvi escrever um bilhete para ele, só não sabia ainda o que escrever, queria alguma coisa simples. Pensei... Pensei... Resolvi dar uma de "desconhecida maluca" e escrevi:

"Olhe para o céu, está um belo dia hoje."

Claro que escrevi e re-escrevi duzentas vezes, com medo de ele achar minha letra feia, pensei sobre o tempo, e se chover? E se o céu ficar feio bem no dia!?
Mas tudo bem, deixei o bilhete escrito para entregar a ele no dia seguinte. Fui dormir.
No outro dia, como todos os outros, fui na padaria, comprei dois pães, um copo de café expresso e o jornal da cidade. Cheguei em casa arrumei a mesa, preparei meu pão e finalmente sentei, de um lado estava o bilhete e do outro o jornal. Li a página policial, os classificados, vi os aniversários da semana, coisa de cidade pequena, sabe. Quando chego na parte dos falecimentos fico chocada com o tanto de gente nova que morre, fico com medo, e hoje... especialmente hoje tinha um jovem rapaz de 38 anos, que morreu dormindo, os familiares escreveram belas coisas dele, parecia ser um bom rapaz, mais embaixo tinha uma foto. Se eu contar de quem era vocês nem acreditam.
Meu café esfriou, minha boca ficou amarga de repente, senti o terrível nó na garganta, olhei pela janela e vi como o céu estava cinzento.

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