terça-feira, 9 de agosto de 2016

Vitamina de abacate e bolo de abacaxi

Era dezembro e eu sei que em dezembro faz sempre tanto calor, eu te acordava ou acordávamos juntos, não consigo me lembrar ao certo, só lembro da sua insistência em abrir a cortina e a minha insistência para aproveitar o resto da manhã na cama, sem nenhum compromisso, você sempre foi teimoso demais. Levantava, abria a cortinha enquanto eu continuava deitada vendo as partículas de poeira dançarem no ar, eu sempre adorei as partículas de poeira contra a luz, desde que era menina do interior do Paraná e deitada na cama, com as pernas erguidas na parede, admirava a poeira pairando enquanto minha mãe gritava para eu levantar logo da cama.
Era dezembro e eu vivia completamente feliz na nossa vida sem luxo em uma apartamento apertado de móveis cheios de cupins. O calor fazia o cigarro apagar, pela força do ventilador que deixávamos ligado 24 horas por dia e você repetia sempre a mesma frase: "Você sempre faz esse cigarro apagar". E eu sempre achei graça nas suas frases que eu tinha que ouvir repetidas vezes, eu sei que foi em dezembro e que logo não vou me lembrar de todas as frases e de todos os nossos domingos deitados na cama mole de colchão duro.
Era dezembro e sentávamos no chão, com uma calculadora, canetas, marca texto e com nossos cadernos de anotar, fazíamos nosso planos sempre tão difíceis e tão apertados. Eu sorria, porque no fundo acreditava demais que daria certo. Guardávamos nossos sonhos nas nossas (agora só suas) pastas e voltávamos a viver nossa vida de compra de mercado contada e felicidade ao sobrar para um pacote de bisnaguinha. Eu sempre odiei bisnaguinha.
Daqui a pouco dezembro chega, o frio está já quase indo embora. Em dezembro eu quero conseguir abrir as cortinhas, até lá não vai ter mais cigarro apagado no vendaval do ventilador. Eu espero desesperadamente dezembro chegar, o calor chegar, porque lembro que em dezembros passados, esperava ansiosamente junho e o frio que passava fora das nossas cobertas, sempre tão quentes e tão bagunçadas. Em junho você esperava sempre um pouco mais para levantar e abrir as cortinas e por isso invernos me doem tanto.
Eu não sei quanto das memórias vou perder até dezembro, não sei se vou sentar no chão e criar uma lista de metas para deixar guardada comigo, mas eu vou abrir as cortinas e passar o café, eu vou escolher domingos para comer pastel de carne seca com milho sentada na minha canga verde. Eu vou passar protetor solar e sair com a minha sombrinha que protege dos raios UV e não vou me envergonhar dela.
Agosto não é mês de criar listas, mas se eu pudesse, minha primeira meta seria: Aguentar até dezembro.

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